quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Fracasso de LHC gera deserção de físicos para máquina rival

05 de agosto de 2009 •
O Grande Colisor de Hádrons (LHC) - construído nas cercanias de Genebra - está cheio de conexões elétricas defeituosas
O Grande Colisor de Hádrons (LHC) - construído nas cercanias de Genebra - está cheio de conexões elétricas defeituosas.
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05 de agosto de 2009
The New York Times

Dennis Overbye


A maior e mais dispendiosa máquina já construída no mundo para o estudo da física está eivada de conexões elétricas defeituosas. Além disso, alguns físicos estão desertando do projeto europeu, ao menos temporariamente, para trabalhar em uma máquina rival, mas de menor porte, do lado oposto do oceano.

Muitos dos ímãs cujos objetivos seriam propelir partículas subatômicas de alta energia por um circuito subterrâneo de 27 km de extensão perderam misteriosamente sua capacidade de operar com altas energias. Depois de 15 anos, US$ 9 bilhões em investimentos e uma cerimônia de acionamento cheia de ostentação no ano passado, o Large Hadron Collider (LHC) - gigantesco acelerador de partículas europeu construído nas cercanias de Genebra - ainda não promoveu qualquer colisão entre partículas.

Mas deve fazê-lo em breve. Deve? Esta semana, os cientistas e engenheiros do Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN) vão anunciar quando e como planejam que sua máquina recomece a operar, no começo do ano que vem. O momento será de festa.

Mas os cientistas afirmam que pode demorar anos para que o colisor seja capaz de operar em plena força, se é que esse objetivo poderá ser atingido. E os problemas encontrados estenderão o prazo necessário a atingir os principais objetivos do colisor, tais como o de produzir a partícula conhecida como bóson de Higgs, que é considerada como responsável por dotar as demais partículas de massa, ou o de identificar a matéria escura que, de acordo com as teorias astronômicas, responde por até 25% do cosmos.

O déficit de energia no grande aparelho também poderia limitar a capacidade do colisor para permitir o teste de ideias ainda mais exóticas, tais como a existência de outras dimensões além das três espaciais e da quarta, o tempo, que caracterizam a vida. "O fato é que provavelmente vai demorar um pouco para que possamos conseguir os resultados que realmente desejamos", disse Lisa Randall, física da Universidade Harvard que é uma das principais proponentes da teoria das dimensões adicionais.

O colisor foi concebido com o objetivo de acelerar prótons a energias da ordem de sete trilhões de elétron-volts e forçá-los a colidir, na busca de partículas e forças que reinaram antes do primeiro trilionésimo de segundo de tempo do universo, mas é possível que, em seu primeiro ano de operação, a máquina funcione com apenas quatro trilhões de elétron-volts. Aperfeiçoamentos que elevariam essa velocidade talvez só possam ser realizadas um ou dois anos mais tarde.

Físicos dos dois lados do Atlântico se declaram confiantes em que a grande máquina europeia terminará por produzir resultados científicos sem precedentes - um dia -, e que não demorará a se equiparar a um equipamento rival construído nos Estados Unidos, ainda que funcionando com energia inferior à projetada.

Todos os grandes aceleradores de partículas passam por problemas iniciais. "São como os problemas pelos quais um bebê passa", disse Peter Limon, físico do Laboratório Nacional do Acelerador Fermi, em Batavia, Illinois, que ajudou a construir o colisor europeu.

Mas alguns físicos admitem certa impaciência. "Esperei por 15 anos, diz Nima Arkani-Hamed, um dos principais teóricos de partículas no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de Princeton. "Quero ver o colisor em funcionamento, rápido. Não podemos tolerar mais um desastre. De agora em diante, ele precisa funcionar sem tropeços".

Os atrasos incomodam mais aos físicos jovens, que podem precisar de dados que só o aparelho poderia obter para concluir uma tese ou uma cátedra. Os problemas no novo acelerador atenuaram a figa de cérebros dos Estados Unidos para a Europa, nesse ramo do conhecimento, porque alguns físicos decidiram trabalhar no Fermilab, onde o Tevatron, o rival norte-americano do LHC, está operando há cerca de uma década.

Os colisores ganham seu ímpeto devido à equivalência entre massa e energia apontada por Einstein - ambas expressas em elétron-volts. O colisor do Cern foi projetado para investigar o que acontece a energias e distâncias nas quais a atual teoria dominante, conhecida como Modelo Padrão, começa a falhar e fornecer respostas absurdas. O projeto recebeu aprovação em 1994, depois que o SuperColisor Supercondutor, que teria comprimento de 86 km e produziria 20 milhões de elétron-volts, foi cancelado pelo Congresso dos Estados Unidos.

As energias prodigiosas com as quais o colisor funciona são, de certa forma, seus piores inimigos. Em plena força, a energia armazenada em seus ímãs supercondutores equivaleria à de um Airbus A380 voando a 720 km/h, e o feixe de prótons gerado poderia perfurar 30 metros de cobre sólido.

A fim de carregar corrente suficiente, os ímãs do colisor são refrigerados por hélio líquido até uma temperatura 1,9°C superior ao zero absoluto, o ponto em que os cabos de nióbio e titânio que os equipam perdem toda a resistência elétrica e se tornam supercondutores. Qualquer perturbação, no entanto, tais como problemas nas soldas em uma junta entre duas seções, podem causar resistência e aquecer o cabo, fazendo com que ele perca sua supercondutividade.

Foi o que aconteceu em 19 de setembro, quando a junção entre dois ímãs se vaporizou em um chuveiro de fagulhas, fuligem e hélio liberado. Os técnicos dedicaram a maior parte do seu tempo, desde o acidente, a limpar e inspecionar os milhares de junções no colisor. Cerca de cinco mil delas terão de ser refeitas, declarou Steve Myers, diretor da divisão do acelerador no Cern, em entrevista.

A explosão das junções desviou a atenção dos engenheiros do mistério quanto ao desempenho insuficiente dos ímãs. Antes que os ímãs supercondutores sejam instalados, os engenheiros "treinam" cada um deles, elevando gradualmente a corrente elétrica que recebem até determinar o ponto em que falham. Dessa maneira, os ímãs se acostumam gradualmente a correntes cada vez maiores.

Todos os ímãs do colisor foram treinados a aceitar energias superiores a sete trilhões de elétron-volts antes de serem instalados, diz Myers, mas quando os engenheiros tentaram conduzir um dos oito setores do anel a uma energia mais alta, no ano passado, alguns dos ímãs falharam inesperadamente.

Em troca de e-mails, Lucio Rossi, diretor do departamento de ímãs do Cern, disse que 49 dos ímãs haviam perdido seu treinamento, nos setores testados, e que era impossível estimar quantos mais, em todo o colisor, estavam defeituosos. Ele disse que os ímãs em questão estavam todos de acordo com as especificações e que o problema talvez derive do fato de que tenham ficado por um ano expostos aos elementos antes que pudessem ser instalados.

Retreinar os ímãs é dispendioso e demorado, dizem os especialistas, e talvez não valha a pena esperar o tempo que seria requerido para elevar seu desempenho à meta de energia original. "Parece que poderemos chegar a 6,5 com alguma facilidade", disse Myers, mas sete trilhões de elétron-volts requereriam "muito treinamento".

Muitos físicos afirmam que, para eles, seria perfeitamente satisfatório que o colisor jamais ultrapassasse os cinco milhões de elétron-volts. Caso fosse esse o caso, diz Joe Lykken, teórico do Fermilab que faz parte de uma das equipes do colisor do CERN, "não seria o final do mundo. Não estou nada pessimista".

Para o futuro imediato, porém, os físicos não devem chegar nem perto desse nível de energia. Myers afirma que, em sua opinião, as junções no momento são capazes de suportar quatro trilhões de elétron-volts. "Poderíamos estar conduzindo trabalhos de Física no final de novembro", ele disse, em julho, antes que novos vazamentos nos tubos de vácuo tivessem forçado um adiamento de mais algumas semanas na retomada das operações do aparelho.

"Não é a energia para a qual a máquina foi projetada, mas ainda assim seria quatro vezes mais energia do que o Tevatron é capaz de propiciar", ele afirmou. Pauline Gagnon, física da Universidade de Indiana que trabalha no CERN, disse que aceitaria alegremente energia dessa ordem. "é o público que paga por isso", ela afirmou mensagem de e-mail, "e precisamos começar a produzir".

Tradução: Paulo Migliacci ME

The New York Times

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